As dietas consistem em retiros temporários no monte, geralmente durante dez dias, em isolamento, com ingestão ritualizada das denominadas “plantas mestras”, sob um regime alimentar definido e regras muito rigorosas de gestão corporal e psíquica.

Cria-se assim um espaço em contacto com a natureza, dedicado à desintoxicação física e energética, para eliminar as substâncias que bloqueiam a sensibilidade. Isto favorece a produção onírica, a recordação de situações do passado não metabolizadas e a introspeção profunda; enfim, o encontro com o “mestre interior”.

Abrimos uma porta interior que nos permite ter contacto com o nosso ser profundo, mas que ao mesmo tempo nos coloca numa situação de vulnerabilidade. Por isso, as medidas de proteção energética são rigorosas tanto para quem faz a dieta como para quem o assiste. Trata-se de evitar o esforço físico em excesso, a exposição ao sol, a chuva, o fogo, certos sabores e odores (inclusivamente dos produtos de higiene pessoal), o contacto com outras pessoas (especialmente doentes, mulheres menstruadas e pessoas que tenham tido recentemente relações sexuais). Evitam-se situações que gerem nervosismo. Exige-se abstinência sexual, eliminação cuidadosa dos excrementos e sobretudo uma alimentação especial.

Embora cada “mestre” imponha as suas normas de acordo com as plantas a ingerir, na grande maioria dos casos permite-se apenas a ingestão de arroz, aveia, banana pão verde assada (karantin) ou cozida (inguiri), tudo preparado sem sal, sem açúcar e sem sabores adicionados, uma ou duas vezes por dia (eventualmente jejua-se). Quem faz a dieta será assistido pelo curandeiro, a única pessoa com quem terá contacto durante este período.

No final deste retiro, o curandeiro “ícara” nos pontos energéticos do paciente e dá-lhe uma mistura de limão, cebola picada, alho, pimento e sal, sentindo-se o efeito reconstituinte imediato do sal. Posteriormente, comerá a primeira refeição em 8 dias, para regressar à cidade no dia seguinte. Para que as plantas continuem a atuar no regresso, mantêm-se algumas restrições durante um período de tempo variável (15 a 30 dias). Não deve comer açúcar (nem mesmo o natural como a fruta), carne de porco, picantes e álcool; nem estar em contacto com perfumes intensos nem ter relações sexuais; não pode visitar doentes nem estar presente em velórios. Todas estas situações acarretam o risco de alteração energética, física e/ou mental, que por vezes pode ser muito exuberante e que em todo o caso requer um tratamento adequado de regulação energética.

Cria-se assim um espaço em contacto com a natureza, dedicado à desintoxicação física e energética, para eliminar as substâncias que bloqueiam a sensibilidade.

Os assuntos abordados na dieta incluem eventos e aspetos de importância vital para cada pessoa, muito íntimos e fortemente ligados aos seus bloqueios e traumas. Por isso, é necessário, num trabalho psicoterapêutico posterior, analisá-los e clarificá-los, projetar no futuro o que foi aprendido e aplicá-lo no quotidiano, pois a dieta é um espaço preferencialmente de aprendizagem.

O tema da “dieta” é um campo ainda quase inexplorado dentro dos recursos da medicina tradicional amazónica, apesar de ser o meio de preparação energética e aprendizagem principal: o curandeiro que não faz periodicamente dietas não poderá curar ou fará um mau uso das energias. Realizar uma dieta não é fácil; requer esforço e sacrifícios que muitos não estão dispostos a fazer.

Se as plantas ingeridas são importantes, as restrições da dieta – alimentação incluída -, são-no ainda mais. Há estudos que abordam os alimentos desaconselhados com a ingestão de inibidores das monoamino oxidases (IMAO) como as betacarbolinas da ayahuasca; isto é, os alimentos ricos em tiramina e que podem causar reações indesejadas. Não há estudos que se tenham ocupado de justificar todas as restrições na “dieta”, as normas da utilização da energia determinadas pelos curandeiros, e menos ainda de encontrar as suas bases científicas. Assim, o aspeto energético é novamente ignorado, restringindo-se à relação linear causa-efeito devida à planta. Porém, isto não explica os efeitos a nível individual deste método terapêutico, e em especial os conteúdos psíquicos surgidos e a sua correlação com cada planta. A comida insípida, hipoprotéica, hipocalórica, hiposódica e rica em potássio modifica o metabolismo e os mecanismos de intercâmbio electrolítico-tecidulares. Produz-se alteração fisiológica percetível pela mesma pessoa; mas de maior importância são as mudanças a nível físico e psíquico.

Efeitos da "dieta"

Banisteriopsis

Embora haja diferença nos efeitos a nível físico e psíquico de acordo com as diferentes plantas tomadas, observamos inicialmente um aumento das funções de excreção, diurese e sudorese, com posterior estabilização. Devido ao sedentarismo e à diminuição da fibra na alimentação, pode haver obstipação. A diminuição de sódio na dieta provoca uma sensação de lassitude inicial que pouco tempo depois é compensada e passa totalmente mal se retoma a ingestão de sal. Há uma leve hipotensão durante o período da dieta e no pós-dieta. O exame sanguíneo demonstra em geral valores normais de glicose, colesterol e uma leve leucocitose (com aumento dos linfócitos) imediatamente após a dieta.

Com determinadas plantas observamos, em alguns casos, mal-estar, dor generalizada ou localizada, vómitos, irritabilidade, tonturas ou diarreia; mas em nenhum destes casos foram tão graves ao ponto de ser necessário interromper a dieta e fazem parte de manifestações de uma desintoxicação geral e transitória. Podem haver também efeitos agradáveis como visões prazenteiras, sensação de integração com a natureza, ampliação da consciência e conexão com a espiritualidade e o transcendental. É frequente a insónia, mas há um notável aumento da atividade onírica e uma amplificação sensorial, efeitos que persistirão depois de reiniciada a ingestão de sal. Não podemos atribuir estes efeitos a um único agente em especial, pois coexistem condições favoráveis que têm efeitos sinérgicos: o espaço físico em contacto com a natureza, o espaço ritual dedicado a este retiro (perde-se a noção do tempo), o isolamento, a ausência de atividade física, a dieta alimentar e as plantas que são ingeridas.

Sobre as plantas da "dieta"

São principalmente as chamadas “plantas mestras”. A escolha realiza-se tendo em conta os requisitos psicofísicos do paciente e as características da planta, às vezes com indicação muito precisa. Pela sua qualidade de ensinamento, o conteúdo dos sonhos e as visões durante a dieta dão indicações não só para o paciente como também de índole geral. Por exemplo, algumas pessoas compreendem o que devem fazer para melhorar a sua vida quotidiana e há quem receba indicações de como curar determinadas doenças, seja para si ou para os outros, ao ponto de que muitos curandeiros se iniciaram durante uma dieta, enquanto se curavam. Este ensinamento é neutro, sem juízo de avaliação ética, e por isso, os curandeiros dizem que há plantas que ensinam também a manipulação energética ou “bruxaria”, embora o efeito final dependerá do interesse do aprendiz, e do cuidado energético durante a dieta e no pós-dieta.

Por exemplo, algumas pessoas compreendem o que devem fazer para melhorar a sua vida quotidiana e há quem receba indicações de como curar determinadas doenças, seja para si ou para os outros, ao ponto de que muitos curandeiros se iniciaram durante uma dieta, enquanto se curavam.

Em relação às características das diferentes plantas ao nível energético, encontramos semelhanças entre os conceitos xamânicos amazónicos e os orientais. Diremos, assim, que há plantas yin ou yang, femininas ou masculinas, que sensibilizam ou fortificam, e devemos ter cuidado ao escolher uma planta para não esforçar estruturas erradas ou debilitar ainda mais uma estrutura débil. A escolha dependerá, então, da estrutura interna observada em cada paciente, e tentar-se-á compensar seus excessos ou carências, seja a necessidade de reconectar-se com as suas emoções, suavizar-se ou fortalecer-se. Esta estrutura está relacionada com o tipo de vício. Por exemplo, os pacientes alcoólicos vivem com a emoção exacerbada (excesso de yin) enquanto os viciados em PBC estão dessensibilizados (excesso de yang).

Cada pessoa manifesta diferentes efeitos de acordo com o seu percurso, sua entrega e suas expectativas ao iniciar a dieta e a sua relação com a planta. Porém, há um padrão comum para cada planta, mais a nível mental e afetivo-emocional que físico, o que nos permite selecionar razoavelmente que aspeto desejamos trabalhar. Os curandeiros que utilizam estas plantas sabem que efeitos a nível físico e psíquico esperar com cada uma, e a nossa observação tem corroborado a certeza das suas apreciações. Não sabemos a que nível atuam nem porque são tão previsíveis os seus efeitos; nem sabemos porque se dão estas semelhanças apesar das grandes diferenças pessoais, mas é surpreendente comprovar a sua eficácia psicoterapêutica e física.

Efeitos adversos

Se as regras inerentes à “dieta” são respeitadas não encontraremos efeitos adversos; estes apresentam-se apenas quando há transgressão. Transgredir as regras restritas que regem o desenvolvimento da dieta denomina-se “cortar ou quebrar a dieta” (“cruzar la dieta”) e as implicações podem ser graves. Será necessária uma correção a nível energético o mais rápido possível.

A severidade dos sintomas dependerá da planta ingerida e da magnitude da transgressão, a qual pode ter sido inclusivamente involuntária. Geralmente o efeito adverso manifesta-se como exacerbação do sintoma que se queria corrigir ou de uma característica pessoal indesejada e pode compreender mal-estar físico, diarreia e vómitos, lipotimia, insolação, cefaleias, arrepios, nervosismo, sonolência ou insónia, pesadelos, irritabilidade, agressividade, medo ou problemas dermatológicos até quadros mais severos a nível psíquico e neurológico. Se bem que a ingestão de açúcar, mesmo em quantidades mínimas, corta ou bloqueia o efeito da planta debilitando quem fez a dieta e inutilizando o efeito da dieta, os odores fortes (perfumes, substâncias químicas) ou as relações sexuais atuam muito mais negativamente, produzindo sintomatologia a nível central como cefaleias e tonturas, no melhor dos casos, e estados de confusão mental e ideação paranóide noutros.

Não consideramos aqui os efeitos que se apresentam durante o período de ingestão por ser passageiro. Embora possam ser percebidos como desagradáveis, as tonturas, vómitos, diarreias, insónia, dores, etc., são apenas parte do processo de eliminação ou reequilíbrio físico e a sua principal importância dentro do processo geral é a sua relação com os conteúdos afetivo-emocionais qua vão surgindo. Estes efeitos variam de acordo com a planta e para corrigi-los é costume usar medidas energéticas como banhos de plantas, soprar ou ícarar com tabaco (mapacho), plantas vomitivas ou purgativas e nalguns casos retomar a dieta ingerindo a mesma planta durante o dobro do tempo.


Artigo original publicado na página web de Onirogénia. Traduzido do españhol para o português por Joana Santos.